sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Caso desafinado

Depois faço uma postagem explicando como se joga "pau-na-lata". Mas em geral, a criança que não está jogando, a chamada "dupla-fora", fica sentada, esperando, e atrapalhando quem está jogando. Esse despeito não faz parte do jogo, mas é o esperado. Muita gente que não sabe fazer, ou baba por quem sabe ou ataca, por se sentir inferior.

Ia eu passando com meu violão, tocando enquanto andava, e no canto externo de um beco tinha um grupo de senhores de uns 40 anos. Conversavam entre si, um encostado num carro. Um comentou: "Não sei como esse cara tem paciência de toda hora que 'tá passando aqui, 'tá com esse violão só fazendo ti-lin-lin, e num sai nada." Há alguns passos, me virei (era noite, então eu não olhava de verdade pra nenhum deles) e perguntei, já bravo: "como é que é, rapaz? Repete isso aí" E um deles falou, num tom aborrecido de quem vai dispensar um assunto alheio: "Nada não, moço. Vai teu caminho, ninguém 'tá falando contigo não." Levantei o queixo e olhei fixo pro que falou, e respondi: "Acho bom mesmo." Continuei andando e ensaiando (quando caminho, é o tempo que tenho pra estudar violão) e um ainda disse, seguido pelos outros: "hai, desafinado". Enfim, segui.

Aconteceu de eu passar pelo mesmo local outro dia e dizerem alguma palhaçada, sei lá, eu tava com fones no ouvido (andando é o tempo que eu tenho pra estudar audição musical).

Hoje eu ia passando de dia, subindo a ladeira, ao contrário das outras vezes. Acho que era o mesmo grupo sentado em banquinhos, não olhei direito pra eles. Aí um senhor de uns 60 anos me chamou, dizendo  que "só tou lhe chamando pra você num ficá pensando que tinha alguém falando alguma coisa com você" (eu já tava numa viagem de que: "e eu ligo pro que você fala ou deixa de falar? Problema seu, meu rei"). Calmamente ouvi ele dizer que falavam, naquela noite de um cara que toca violão desafinado (pensei comigo na hipocresia do cabra). Calmamente falei pra ele: "Olha... eu não acredito em você" Ele começou a me interromper, como todos fazem, mas na calma, expliquei que "você não precisa que eu acredite em você ou não, assim como eu não preciso acreditar no que você fala ou não" Terminei a frase a muito custo, enquanto ele me dizia: "ah, então você é um ignorante." Eu disse que sim e segui meu caminho. Ele falou alto, mas pros amigos "Se passar aqui, eu vou é quebrá esse violão na sua cabeça"" Perguntei: "Como é que é? Se enxergue, meu irmão"

Cena final
Se fosse antigamente, eu xingava o cara calmamente de imbecil, verme, inútil, etc, etc, mas a cena que ainda não conclui o caso imagino assim: alguém fala, vou andando até o cara. Encaro, olho nos olhos pra que ele veja o momento em que vou olhá-lo da cabeça ao pés e falo algo que o faz se sentir invejoso de quem sabe tocar e continuo sem olhar pra cara de quem não merece.

Quando tou de sangue quente, tenho paciência pra analisar não. Esse caso me é mais interessante de contar, e prefiro que você analise. Mas não me venha com onda de dizer que "ah, se eu fosse, acho que não tinha necessidade de..." Não falemos dos "se's", mas dos fatos. Ok?